Contratos de Ensino Particular Face ao Código de Defesa do Consumidor

Contratos de Ensino Particular Face ao Código de Defesa do Consumidor
Contratos de Ensino Particular Face ao Código de Defesa do Consumidor

Por: NEWTON RUBENS DE OLIVEIRA


CONTRATOS DE ENSINO PARTICULAR


FACE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

SINOPSE


Uma análise da Lei de Mensalidades Escolares e o Código de Defesa do Consumidor e suas implicações nos contratos de ensino superior particular foi enfoque deste trabalho.

Os alunos pais e responsáveis tem enfrentado muitos problemas no que tange aos contratos de ensino superior particular. Problemas referentes a matrícula, entrega de documentos, cobrança de mensalidades escolares e problemas acerca da interpretação, aplicação e execução dos contratos afligem muitos usuários de ensino superior.

A Lei de Mensalidades Escolares e o Código de Defesa do Consumidor forma instituídos com o fim de minimizar a aflição dos alunos do ensino superior. Estas Leis dispõem acerca das regras a serem observadas nos contratos e estabeleceram novos princípios que norteiam a formação e execução dos contratos de ensino.

Para explicar as novas noções acerca dos contratos em geral até chegarmos nos contratos de ensino superior, foi feita uma abordagem histórica dos contratos, a partir do séc. XIX.

A partir da abordagem histórica, foram tratados neste trabalho, os princípios, os elementos de formação do contrato;

Para tornar a leitura mais fácil e agradável, antes de se atacar problemas enfrentados pelos usuários do ensino superior, passamos primeiramente a definir as partes que participam desta relação jurídica contratual e seus direitos.

Estabelecendo os princípios que norteiam os contratos e os direitos das partes, é possível estabelecer soluções as aflições dos contratantes do ensino superior particular.

Por fim, após o enfoque de cada item desta obra, apresento uma conclusão sintética, de forma que seja depurada qualquer dúvida, pois o tema é por demais importante para deixarmos qualquer ponto em obscuro.


Newton Rubens de Oliveira1


INTRODUÇÃO


A educação é sem dúvida um dos pontos mais importante, senão o mais importante, para o desenvolvimento das culturas e de qualquer nação.

A Constituição Federal de 1988 destinou um Capitulo, de n° II, para a garantia dos direitos sociais. A definição dos direitos sociais esta contida no art.6°, da CF/88, e não por acaso, a educação é o primeiro dos direitos a ser garantido, conforme se observa da redação do artigo supracitado: “Art.6° São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer...”, e mais a educação é dever do Estado conforme determina o art.205, da CF/88.

Isto demonstra, inclusive, a preocupação do legislador constituinte com a educação. Preocupação que tem como ratio o desenvolvimento do país. Não se desenvolve, o país, sem a formação de cidadãos conscientes, com formação política e cientifica. O documento II da Reforma da Educação Superior proposta pelo Ministério da Educação, onde reafirma os princípios e Consolida Diretrizes da Reforma da Educação Superior, informa que a educação, principalmente a educação superior deve ser voltada para o desenvolvimento do país.

O direito a educação é a mãe dos outros direitos sociais. A evolução das ciências da saúde, a formação de profissionais qualificados nesta área com atuação ética para com a população, a segurança pública, e ainda a garantia de trabalho digno a todos, são apenas direitos que passam necessariamente pela educação universal e de qualidade.

A partir da Carta de 1988, uma das maiores preocupações do Estado foi exatamente a universalidade da educação e garantir o acesso ao ensino. E de fato os entes da Federação - União, Estados e Municípios - tem trabalhado para tornar acessível à população a educação, diminuindo os índices de analfabetismo, e até aumentando o número de vagas em instituições de ensino superior.

Frise-se que, o ensino é dividido, segundo o art. 21, da Lei de Diretrizes e Bases, em Ensino Básico que compreende o ensino infantil, fundamental, médio e Ensino Superior, sendo os dois primeiros gratuitos e obrigatórios ou pelo menos deve ser assegurada a gratuidade pelo Estado, o que não impede a exploração pela iniciativa privada, quanto ao ultimo não há garantia constitucional de gratuidade para todos. Isto, pelo fato do Estado não ter condições de ofertar a todos este acesso, assim, a contribuição da iniciativa privada para suprir este mister é essencial.

Instituições privadas de ensino superior é o cerne deste trabalho. Não em sua estrutura jurídica ou física, mas nas suas relações jurídicas com os usuários dos serviços de ensino superior efetivos e em potencial. A relação contratual entre consumidores e instituições de ensino superior sob a égide da Lei de Mensalidades Escolares (Lei 9870/99) e o Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei 8078/90) são as bases deste trabalho que se segue.













CAPITULO I

DA PERTINÊNCIA DO ASSUNTO


Tendo em vista o objetivo desta, e ainda o tempo para a sua conclusão, não será aprofundado o tema deste capitulo, como carece. Todavia, serão traçadas algumas linhas que trarão a baila, de forma sucinta, à importância deste assunto.

A Constituição Federal em seu art.6° c/c o art.205, determina ser a educação um direito social e direito de todos e um dever do Estado e da família, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa visando seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. O ensino será ministrado segundo o princípio constitucional da universalidade e da garantia do padrão de qualidade (art.206, da CF/88).

Observa-se que a responsabilidade da educação não é só do Estado, mas também da família, tamanha a sua importância.

Tendo em vista que o Estado não pode garantir o acesso a todos o ensino superior nos termos da Lei de Diretrizes e Bases, ou seja, a graduação e pós-graduação, latu senso e estrito senso, é concedido à iniciativa privada autorização para ministrar a educação para o ensino superior.

Destarte, tem crescido na ultima década a criação de Universidades, Universidades Especializadas, Centros Universitários, Institutos Superiores, Faculdades Integradas, Faculdades Isoladas, etc. em sua grande maioria a partir da iniciativa privada, e por conseqüência tem crescido também o numero de matriculas, como se observa do quadro2 seguinte:



O Brasil está colocado em sétimo lugar entre as nações do mundo com maior número de instituições de ensino superior privadas e, também, é um dos países da América Latina em que o processo de privatização do ensino superior se deu de forma mais acelerada. Os Estados Unidos ocupam a 20ª posição. Estes dados, a expansão e a massificação da universidade foram discutidas no Seminário Internacional Reforma e Avaliação da Educação Superior – Tendências na Europa e na América Latina.3

Neste interim aumentou a concorrência entre as instituições de ensino e, aumentou o numero de consumidores usuários de serviços de educação superior. É importante salientar que este serviço é publico. Ocorre porem, e infelizmente, que a qualidade deste serviço não caminhou na mesma proporção em que se deu o acesso a este ensino.

Nestes casos, onde o ensino é prestado indiretamente pelo Estado, por meio dos entes privados, deve ser observada a condição, nos termos do art.209 da CF/88, de cumprimento das normas gerais da educação nacional e autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Publico, (inciso I e II, do artigo citado).

Vale lembrar que mesmo os serviços prestados por instituições de ensino superior privado, os serviços não perdem a sua natureza de serviço público. Nesta relação, entre as Instituições de Ensino Privado e os alunos ou possíveis alunos, estes recebem uma especial proteção do estado por serem considerados consumidores destes serviços. Esta proteção decorre de obrigação constitucional. A Constituição Federal assim determina em seu art. 5°, XXXII: “O Estado promoverá, na forma da Lei, a defesa do consumidor”.

Com o crescimento da oferta de vagas por instituição de ensino superior privado, cresceu também, o conflito entre as partes nas relações contratuais no que tange ao ensino superior. Embora a Carta Magna tenha determinado ser dever do Estado proteger o consumidor, e desde 1990 (mil novecentos e noventa) momento da publicação do Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei. N° 8078/90), os usuários dos serviços de ensino particular, parte mais fraca na relação contratual, tem sofrido vários abusos, seja em decorrência do contrato com clausulas abusivas, ou de forma extracontratual. Neste contexto, apenas em 1999 (mil novecentos e noventa e nove), foi editada a Lei de Mensalidades Escolares (Lei n° 9870/99), e ainda assim, não é rara às vezes que insurge problemas e divergências entre os interesses da sociedade usuária dos serviços em comento.

Acerca destas divergências, citamos como exemplo, os problemas referentes às matrículas e renovação de matrículas, e ainda acerca dos valores das mensalidades escolares, inadimplência, documentos a que os consumidores têm direito, cobrança de serviços extras que não estão incluídos nos contratos principais.

Destarte, ante aos problemas que ainda se insurge, e com vista sempre ao desenvolvimento da sociedade brasileira nos termos do art. 205, caput, da CFB/88, não há como não reconhecer a relevância incomensurável deste tema. Trazer a hermenêutica da legislação de mensalidades escolares, e sua integração com a legislação de proteção do consumidor, com vista a sua aplicação as relações jurídicas estabelecidas entre usuários dos serviços dos serviços de ensino particular e as instituições de ensino particular pode ser a luz e a depuração de uma expressão algébrica para o futuro de muitos cidadãos e ainda de uma sociedade melhor que o país precisa construir.

Talvez a suscitar apenas a preocupação constitucional acerca do caso fosse suficiente para demonstrar a pertinência do assunto, mas foram acrescentados alguns outros dados para atinar a curiosidade dos que tenham dúvidas de que o assunto é atual e relevante. De fato não se esgotou a explicação acerca da importância do assunto. Outros elementos poderiam ser apresentados, bases sociológicas e econômicas poderiam ser trazidas. Mas acreditamos ser suficiente o que fora até o momento descrito.

Ex posittions” passamos a adentrar nos pressupostos e elementos dos contratos em comento e em outros pontos importantes conforme se segue.




CAPITULO II

DOS CONTRATOS EM GERAL


I – Da Evolução dos Contratos.


Não podemos adentrar nos princípios e elementos que formalizam ou formam o contrato de ensino superior particular, bem como o seu conceito, sem antes adentrar na evolução dos contratos explicando, ainda que de forma sucinta, a sua natureza jurídica e as formas de sua interpretação.

Formou-se o conceito moderno de contrato, sob a confluência de diversas correntes, sendo duas básicas: A dos canonistas e a da escola do direito natural4.

Para a escola canonista tinha grande relevância o consentimento, e que a vontade era a fonte de toda a obrigação. O respeito à palavra dada e o dever da veracidade justificam, de outra parte, a necessidade de cumprir as obrigações pactuadas, fosse qual fosse a forma do pacto, tornando necessária à adoção de regras jurídicas que assegurem a força obrigatória dos contratos, mesmos os nascidos do simples consentimento dos contratantes.5

A escola do direito natural, racionalista e individualista, defendia que encontrava-se, na vontade livre dos contratantes, o fundamento racional do nascimento das obrigações. Neste particular entendia Pufendor6 que o contrato é um acordo de vontades, expresso ou tácito, que encerra compromisso a ser honrado sobre a base do dever de veracidade, que é de Direito Natural. Para esta o contrato faz lei entre as partes (pacta sunt servanda). Este princípio foi consubstanciado como norma no Código de Napoleão.

Este conceito individualista perdurou e perdura ainda em nosso tempo, pela consolidação do regime de capitalista de produção. Esta concepção trouxe maior segurança jurídica nas relações contratuais, principalmente nos contratos mais modernos, onde boa parte das relações jurídicas mercantis ou empresariais são estabelecidas em linhas de crédito. Todavia, neste modelo, não havia distinção dos personagens que participavam destes negócios jurídicos, nem mesmo levava em conta o objeto dos contratos.

Contemporaneamente a noção de contrato é outra. Não em sua noção obrigacional puramente, mas em sua formação em si. O Estado passou a diferenciar em certos aspectos as pessoas que participam do contrato, bem como, passou a interferir na liberdade de contratar. Esta mudança é recente, e não se deu de forma abrupta, mas de forma gradual e decorreu do clamor social e da observação do legislador ante ao latente desequilíbrio entre partes em certos contratos, como nos de trabalho e de consumidor.

O Novel Código Civil seguiu esta evolução do Direito Privado e passou a determinar que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato (art.421) e ainda, tornou patente a aplicação dos princípios da boa fé e probidade, tanto na formação e na execução do contrato, princípios que já tinham previsão no CDC. O ilustre Professor Miguel Reale na Exposição dos Motivos do Supervisor da Comissão Revisora e Elaboradora do Código Civil, assim se manifestou: “Por outro lado, firme consciência ética da realidade sócio-econômica norteia a revisão das regras gerais sobre a formação dos contratos e a garantia da sua execução eqüitativa, bem como as regras sobre a resolução dos negócios jurídicos em virtude de onerosidade excessiva, às quais vários dispositivos expressamente se reportam, dando a medida do propósito de conferir aos contratos estrutura e finalidade sociais. É um dos tantos exemplos de entendimento da socialidade do Direito.”

Assinalam-se como principais fatores das transformações ocorridas na Teoria Geral do Contrato: a insatisfação social devido ao desequilíbrio entre as partes, atribuído ao princípio da igualdade formal, a modificação técnica de vinculação por meio de uma relação jurídica, e por fim, a intromissão do Estado na vida econômica.


II – Dos Princípios.


Assim, com o decorrer da evolução natural da ciência do direito, mais precisamente no direito privado, foram estabelecidos princípios que devem ser observados tanto na formação do contrato quanto em sua execução.

Alguns dos princípios já foram abordados nos decorrer deste trabalho, e para não cairmos em redundância não iremos repetir a lição de forma mais aprofundada.

Um dos princípios já tratado e que é aplicável aos contratos, e faz parte de sua natureza é o princípio da autonomia das partes que se manifesta sob o tríplice aspecto: a) liberdade de contratar propriamente dita; b) liberdade de estipular o contrato; c) liberdade de determinar o conteúdo do contrato7.

Este princípio vem sendo mitigado em beneficio da ordem pública, conforme já ponderado, pois nos contratos modernos a intervenção do Estado se tornou mais presente, estabelecendo normas proibitivas que atingem o momento da formação do contrato e ainda em sua interpretação e em sua execução.

O consensualismo é outro princípio que é aplicável e é da natureza do contrato. Este princípio decorre da evolução do direito privado. A partir deste princípio a simples manifestação de vontade é suficiente para a criação de obrigações, e que para a formação do contrato, não se exige forma especial.

Outro princípio aplicável é o da força obrigatória, que surgiu com o liberalismo econômico, para dar maior segurança nos negócios jurídicos. Com este princípio o contrato faz lei entre as partes. Esse princípio mantém-se no direito atual com algumas atenuações, também em benefício da ordem social.

Por fim, o princípio da boa-fé que deve acompanhar todas as fases de um contrato, tanto na formação e aplicação quanto na execução. Em síntese, por este princípio as partes devem agir com lealdade e confiança recíproca. Este princípio teve indicação legal no Código de Defesa do Consumidor, art.4°, III, e com a evolução do direito brasileiro, passou a ter previsão expressa no Novo Código Civil (Lei 10406/2002).

Todos os princípios aqui descritos são aplicáveis aos contratos em geral, e também aos contratos de prestação de serviços de ensino particular. Afora estes, também é aplicável aos contratos de ensino superior particular outro importante princípio que é o do reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo. Para Nelson Néry Junior8, este princípio que permeia as relações de consumo, esta em verdade a dar realce específico ao principio constitucional da isonomia, dispensando-se tratamento desigual aos desiguais. A vulnerabilidade do consumidor independe de condição social, cultural ou econômica. Não é mera presunção legal, e por isto não admite prova em contrário.


III – Dos Elementos.


Passando pelos princípios passamos a determinar os elementos que compõem os contratos de prestação de serviços de ensino particular. Aliás, diga-se de passagem, são elementos que compõem, em geral, todos os contratos.

Para ter validade o contrato requer a conjunção de elementos extrínsicos e intrínsicos. A doutrina os distingue sob os nomes de pressupostos e requisitos.

Os pressupostos dizem respeito à capacidade das partes, a idoneidade do objeto e a legitimação para realiza-lo. Segundo Ferrara, são as condições sob as quais se desenvolve e pode desenvolver os contratos.

Qualquer contrato requer agente capaz, ou seja, pessoa apta para a pratica dos atos da vida civil. Não sendo capaz, o contrato deverá ser assinado por responsável. É o que ocorre nos contratos de ensino particular. Isto vale para a parte que esta no pólo referente ao contratante. Já para a parte contratada, instituição de ensino, sua capacidade recai acerca de sua criação propriamente dita e da autorização para a criação de cursos junto ao Poder executivo, nos termos do art.4, da Lei 9394/96, c/c o art.13, do Decreto 3860/2001.

A idoneidade do objeto recai sobre a sua possibilidade e licitude. Isto é, o objeto deve ser tecnicamente possível de ser contratado, e ainda, que não seja, por política legislativa, proibida por Lei. O objeto do contrato de ensino particular é exatamente a prestação de serviços educacionais que é um serviço público e como tal exige, do Poder Público, previa autorização.

A autorização diz respeito tanto a criação da instituição de ensino quanto à abertura do curso. Não havendo autorização, o objeto é ilícito, visto que a contratação de serviços de ensino superior, sem o preenchimento deste requisito destoa do ordenamento jurídico e por este fato é nulo o contrato.




CAPITULO III

DAS PARTES NA RELAÇÃO CONTRATUAL.


O contrato é uma espécie de negocio jurídico, formado por pelo menos duas partes. Ou seja, é um negocio jurídico bilateral ou plurilateral.

Nos contratos de prestação de serviços de ensino, não se encontra na lei especificadamente, o conceito das partes nesta relação contratual. Tomando por base a experiência européia do jurista belga Thierry Bourgoinie, citado por Arruda e Tereza Alvim, in Código de Defesa do Consumidor Comentado, Ed. Revista dos Tribunais, o legislador, via de regra, não define precisamente os benefícios da Lei. Isto tem uma razão de ser, pois não definindo precisamente os sujeitos, aumenta o âmbito de aplicação da norma. Todavia, no caso da legislação brasileira de mensalidades escolares (Lei 9870/99), o legislador não definiu os sujeitos que participam dos contratos de prestações de serviços educacionais. A omissão do legislador, neste caso é justificada, pois, ao não se dar o trabalho trazer esta definição, deixou a aplicação do Código de Defesa do Consumidor mais patente e sem dificuldades. Mesmo antes do Advento da Lei 9870/99, os Tribunais não encontravam problemas em aplicar o CDC, as relações jurídicas estabelecidas entre instituições de ensino e usuários dos serviços prestados por estas9.


I – Das Instituições de Ensino Superior - IES.


A Lei de Diretrizes e Bases determinou que o ensino superior será ministrado por instituição de ensino superior, publica ou privada, com variados graus de abrangência ou especialização (art. 45, da Lei 9394/96). Assim figura em um dos pólos dos contratos de ensino superior privado, uma pessoa jurídica de direito privado. De acordo com a Lei 9131/95, alterada pela Lei 9870/99, em seu art. 7°, prevê que “as pessoas jurídicas de direito privado, mantenedoras de instituições de ensino superior, previstas no inciso II do art. 19 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, poderão assumir qualquer das formas admitidas em direito, de natureza civil ou comercial e, quando constituídas como fundações, serão regidas pelo disposto no art. 24 do Código Civil Brasileiro”. A atual redação do art. Desta Lei deve ser modificada em sua parte final para “de acordo com o art.62, do Código Civil Brasileiro”, em vista a alteração dada pela edição do Novel Código. Assim, a forma de constituição da instituição de ensino privada, pode se dar como associação, sociedade, fundação, entidade sem fim lucrativo, etc.

O art.20, da Lei 9394/96 situa as categorias em que as instituições de ensino se enquadrarão. Senão vejamos:


        “Art. 20. As instituições privadas de ensino se enquadrarão nas seguintes categorias:

        I - particulares em sentido estrito, assim entendidas as que são instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas de direito privado que não apresentem as características dos incisos abaixo;

        II - comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas de professores e alunos que incluam na sua entidade mantenedora representantes da comunidade;

        III - confessionais, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas que atendem a orientação confessional e ideologia específicas e ao disposto no inciso anterior;

        IV - filantrópicas, na forma da lei.”


Estas pessoas jurídicas de direito privado, mantenedoras de instituição de ensino superior, recebem uma autorização do Poder Público, para prestarem serviços de ensino superior, nos termos do art.4º da Lei 9394/96, c/c o art.13 do Decreto 3860/2001.

A partir destes dados é possível determinar ou conceituar a instituição que prestará os serviços de ensino superior que é pessoa jurídica de direito privado, credenciada e autorizada pelo Poder Público para a prestação de serviços de ensino superior.

A partir deste conceito é possível observar que o mesmo se encaixa no conceito de fornecedor de serviços nos termos do art. 3°, da Lei 8078/90. O parágrafo segundo, do artigo citado do CDC, “serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.





II – Dos Consumidores dos Serviços de Ensino Superior Particular.


Conforme já ponderado a Lei de Mensalidades Escolares não definiu as partes que participarão do contrato de prestação de serviços de ensino superior. Todavia, é possível determinar o pólo oposto ao da instituição de ensino superior a partir do conceito amplo previsto no Código de Defesa do Consumidor – CDC. O art.2°, do referido diploma legal, conceitua consumidor como “toda pessoa física ou jurídica que adquiri ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Quando se fala em consumidores de serviços ensino superior, soa como se a prestação deste serviço público fosse apenas algo colocado no mercado de consumo, como se o usuário deste serviço estivesse comprando seu diploma, mas em verdade não é, mesmo porque à utilização destes serviços com o pagamento de sua contraprestação não enseja o direito a receber o diploma de graduação ou pós-graduação.

Estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo, formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua; promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicações ou de outras formas de comunicação, suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do conhecimento de cada geração, estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade, promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição, são objetivos que devem ser perseguidos pela Instituição de Ensino Superior e pelo aluno usuário deste serviço. O recebimento do diploma é conseqüência deste trabalho, e não faz jus a este quem não busca a verdadeira finalidade do ensino.





CAPITULO IV

DA CLASSIFICAÇÃO DO CONTRATO.


Os contratos de prestação de serviços de ensino particular superior não fogem a regra geral das classificações aceitas pela maioria da doutrina.

Classifica-se o contrato de ensino superior em:


I – Bilateral ou sinalagmático, isto é contrato em que se estabelecem obrigações recíprocas. Já vimos que todo o contrato é bilateral ou plurilateral, mas isto sob a óptica de que sempre figurara duas partes em que manifestarão a sua vontade. “A bilateralidade diz respeito à composição subjetiva do suporte fático, ao nascimento do negócio jurídico, com duas manifestações de vontades concordes (plano da existência).”10

Sobre a sua eficácia é que o contrato pode ser unilateral, bilateral ou plurilateral, e onde situa a presente classificação. O contrato de prestação de serviços de ensino superior é bilateral, pois a sua eficácia, e possibilidade de constituir obrigações recaem sobre as duas partes, quais sejam a instituição de ensino superior e o usuário deste serviço. Em síntese, a obrigação da Instituição é prestar os serviços nos termos do que determinam a Lei, e, ao usuário ou seu responsável é o de pagar em dia as mensalidades escolares nos termos do acordado no instrumento.


II – Não Solene. Prevalece o princípio da liberdade da forma, no direito moderno11. Assim, via de regra, os contratos não tem forma, pode se dar de várias maneiras (escrito, verbal, por instrumento público ou particular). Todavia, o Estado passou a intervir na liberdade de contratar, sobretudo, no que tange a forma de constituição, em contraposição a este princípio. Assim, alguns contratos passaram a ter forma prescrita em Lei. Este contrato se classifica em solene.

Destarte, os contratos de ensino superior particular, em virtude de a lei não determinar nenhuma formalidade para a sua constituição, são classificados em Não Solenes.


III – De Execução Periódica. Os contratos em geral podem ser de execução instantânea onde as prestações podem ser realizadas em um só instante. Todavia, o contrato de ensino superior particular classifica-se como de duração de execução periódica. Todos os contratos somente podem ser assim considerados pela sua natureza12, ou seja, são aqueles que sua própria natureza não permitem que sejam prestados de uma só vez.


IV - Principais e Acessórios. Os contratos principais são autônomos e existem de per si, sem dependência de outro contrato. Já os contratos acessórios somente existem em decorrência de outro que é o principal. Os contratos de ensino superior particular são sempre principais, e deles podem surgir outros acessórios, como o caso de fiança e caução.


V – De Adesão. O Código de Defesa do Consumidor em seu art.54, caput, definiu o que vêm a ser o contrato de adesão. O referido diploma o descreve como “aquele cujas clausulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo”.

Percebe-se que o traço caracterizador deste contrato é justamente o modo de sua formação. Neste não existe a fase de tratativas preliminares, que nas demais modalidades de contrato tem como objetivo estabelecer as vantagens e desvantagens, em condições de igualdade, a serem traduzidas nas clausulas contratuais.13 Ao revés há sempre a elaboração de formulas rígidas previamente estabelecidas de forma unilateral.

Claudia Lima Marques indica a seguintes características do contrato de adesão: “pré-elaboração por apenas uma das partes (a outra adere); oferta uniforme e em caráter geral para um numero indefinido de futuras relações contratuais e modo de aceitação, ou seja, adesão”.14

Data vênia, descordamos, neste ponto, da Ilustre Professora, pois nem todos os contratos em sua formação possuem todas estas características indicadas, como ocorre nos contratos de ensino superior particular. Nestes contratos o numero de futuras relações contratuais são previamente estabelecidos, no momento da abertura do curso e vinculam-se as pessoas aprovadas em processo seletivo prévio. É o vestibular propriamente dito. Para a abertura do curso é preciso autorização do Poder Público (art.4°, da Lei 9394/96, c/c o art.13, do Decreto 3860/2001). Após a abertura do curso, é feito edital tornando público a abertura do curso, possibilitando a todos que tenham no mínimo concluído o ensino médio a prestar o vestibular. As pessoas aprovadas neste vestibular estarão aptas a celebrar o contrato de prestação de serviços educacionais. Desta forma, a oferta não é para um número indefinido de pessoas, e sim, para um número perfeitamente definido de pessoas aprovadas no vestibular.

Nem por isto, o contrato de prestação de serviços de ensino superior perde a sua característica de contrato de adesão, pois em verdade é necessário apenas que o contrato tenha sido elaborado exclusivamente pelo fornecedor e que tenha a adesão do consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor não definiu este instrumento inutilmente. Após defini-lo construiu um arcabouço de proteção do consumidor, porque este diploma, todo, assim o é. Tanto é que o sistema de proteção contratual, das seções II e III do capitulo IV, do CDC, tem como cerne maior proteger o consumidor e “evitar o abuso do contrato do contrato de adesão, no ato de elaborar o contrato etc”.15

Neste ínterim, o parágrafo terceiro do art. 54, do CDC, determina que os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor, Seguindo esta linha o § 4°, do artigo supracitado dispõe que as clausulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidos com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.

Mas estas disposições dos parágrafos do art.54, não teriam razão de ser e não cumpririam sua finalidade senão fosse conjugado com o art. 47, do CDC, que traz a regra de que os contratos de adesão sejam interpretados de maneira mais favorável ao consumidor. Ora! É claro que o fornecedor, e principalmente uma instituição de ensino superior tem condições técnicas para redigir o contrato de forma clara e sem ambigüidades, todavia, alem disso, para evitar problemas na interpretação do contrato (caso em que o fornecedor redija de má-fé ou que redija com inépcia), o mesmo será interpretado de maneira mais favorável ao consumidor.

Também no contrato de adesão admite-se clausula resolutória, desde que alternativa, e cabendo ao consumidor a escolha (§2°, do art. 54, do CDC). É importante lembrar que a inserção de clausulas no formulário não desfigura a natureza de adesão do contrato (§1°, do art. Citado).


VI - O contrato de prestação de ensino superior classifica-se como bilateral ou sinalagmático, principal, escrito, mas não solene, de execução periódica e de adesão.



CAPITULO V

DOS DIREITOS DAS PARTES


Este é um ponto crucial, deste trabalho, pois é tempo de depuração dos direitos das partes que participam do contrato de ensino superior privado. Embora o Código de Defesa do Consumidor esteja em vigor desde 1990, não raro vemos que os direitos dos consumidores sejam desrespeitados. Muitas vezes porque o fornecedor desconhece de fato os direitos dos consumidores ou interpreta de forma equivocada. Há presunção legal de que todos conhecem a lei (art.3°, da Lei de Introdução do Código Civil). Porem, isto nem sempre ocorre, as pessoas de fato desconhecem seus direitos ou deveres ou interpretam de forma errada. Sem contar, principalmente, nos casos de má fé do fornecedor.

Também, não é incomum que o consumidor achando estar dentro de seu direito efetua reclamações junto aos órgãos de defesa do consumidor ou propõe ações no Judiciário, desconhecendo efetivamente direitos das instituições de ensino.

O “desconhecimento” destes direitos ocorre por motivos sociais, políticos etc, motivos que podem abrir espaço para outra discussão, mas não vem ao caso. O fato é que a Legislação, em caráter geral, mas de forma clara, estabeleceu boa parte dos direitos das partes na relação jurídica estabelecida a partir do contrato de prestação de serviços de ensino superior particular e que serão agora trabalhados.


I – Dos Direitos das Instituições de Ensino Superior.


A Lei não traz de forma clara os direitos dos fornecedores. Não há na Lei 9870/99, direitos expressos das instituições de ensino. Os direitos dos fornecedores nas suas relações contratuais são estabelecidos neste mesmo instrumento. O Estado somente vem a intervir nestas relações jurídicas quando se está presente um desequilíbrio, o que fundamenta a elaboração de norma de proteção de uma parte, para estabelecer igualdade neste negócio jurídico.

No caso de contratos onde se estabelece relação de consumo, restou patente a vulnerabilidade do consumidor frente ao fornecedor. Assim, sendo a Instituição de ensino superior privado um fornecedor não é razoável a criação de norma para protege-la. Ao revés do usuário deste serviço – um consumidor – que precisa da proteção do especial do Estado.

Assim, de modo geral, os direitos da instituição de ensino superior privado, estão contidos no contrato. Estes contratos não estão alheios ao pálio do ordenamento jurídico, o que assegura a eficácia deste para o fornecedor. O principal efeito do contrato é criar um vinculo jurídico entre as partes. E uma vez perfeito e acabado, não pode ser desfeito ou alterado senão por outro acordo de vontades16. Comporta algumas exceções, mas não desfigura a natureza da força vinculante do contrato (pacta sunt servanda).

Sendo válido o contrato nasce para as partes direitos e obrigações. A principal obrigação da instituição de ensino superior privada nestes contratos é a prestação dos serviços educacionais com qualidade, prestando ao fim que se destina nos termos da Lei. E seu principal direito é o de exigir que seu pólo oposto cumpra com a sua que é a de pagar por este serviço. De acordo com o art.1°, §3°, da Lei 9870/99, a instituição poderá cobrar por este serviços de acordo com o regime semestral ou anual parcelando em seus ou doze vezes o valor total.

Também é seu direito e dever avaliar o aluno durante todo o curso certificando se o aluno está apto a receber o diploma de graduação ou pós-graduação.

Um direito que esta expresso na legislação é da instituição recusar a renovação da matrícula do aluno inadimplente (art.5°, da Lei 9870/99), fato que será aprofundado posteriormente.

Em decorrência da autonomia constitucional conferida as instituições de ensino superior a Lei de Diretrizes e Bases no parágrafo único do art.53, estabelece que as mesmas podem criar, expandir, modificar ou extinguir cursos. Todavia, para o exercício destes direitos devem ser observados os atos jurídicos perfeitos, ou seja, não pode estes direitos atingir contratos firmados e juridicamente perfeitos.

Estes são basicamente os direitos das instituições de ensino, passamos aos direitos dos usuários destes serviços ou consumidores propriamente dito.



II – Dos Direitos Básicos dos Usuários dos Serviços de Ensino Superior Privados.


Enveredamos para os direitos dos usuários dos serviços de ensino superior, a parte mais importante e a que exige demasiado esmero, pois, é o momento de tratar dos contratos de ensino superior privado frente a defesa do consumidor.

Neste compasso, a formação destes direitos vem sob o pálio da transposição dos princípios já tratados, quais sejam o da boa fé, equidade, reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor etc.

Por motivos didáticos trataremos destes direitos a partir do elenco de direitos básicos previstos no art.6°, do CDC, mesmo porque, segundo Arruda Alvim e Thereza Alvim, em seu Código de Defesa do Consumidor Comentado, citando o Programa Preliminar da Comunidade Econômica Européia para uma Política de Proteção e de Informação dos Consumidores, constante da Resolução do Conselho de 14 de abril de 1975, informa que “os interesses dos consumidores podem ser agrupados em cinco categorias de direitos fundamentais:


  1. direito a proteção da saúde e da segurança;

  2. direito a proteção dos interesses econômicos;

  3. direito a reparação dos prejuízos;

  4. direito a informação e a educação;

  5. direito a representação”.


Estes itens sintetizam os direitos básicos previstos nos incisos do art.6°, da Lei 8078/90 e os direitos ali expressos são perfeitamente aplicáveis aos contratos de prestação de serviços de ensino superior. Não há dúvidas quanto a aplicabilidade do CDC a estes instrumentos, pois da análise das partes que participam deste negócio jurídico, é de se observar que a relação jurídica estabelecida é de consumo, e a Lei de Mensalidades não estabelece nenhuma dicotomia, ao contrário, nesta a previsão de aplicabilidade da Lei de Proteção do Consumidor é expressa, conforme consta em seus arts. 4° e 8°.


A) Proteção a Vida, Saúde e Segurança.


O primeiro direito previsto no art. 6°, refere-se a proteção da saúde e segurança do consumidor. O inciso I possui a seguinte redação:


“Art.6°. São direitos básicos do consumidor:

I – a proteção da vida, a saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;”


Pela redação de inciso acima, em princípio não se vislumbra aplicabilidade aos contratos. De fato, à proteção à vida e à saúde do consumidor é direito extrínseco aos contratos, pois via de regra, não estão explicitados. Assim, esses direitos estão no plano da responsabilidade extracontratual por definição legal.

Embora a prestação de serviço educacional não seja por natureza considerado nocivo, é dever da instituição de ensino superior velar por este direito. Isto, porque a vida, saúde e segurança, constantes deste inciso I, estão afetos ao “princípio da garantia de adequação”, constante do art. 4°, do Código de Defesa do Consumidor, e referem-se ao binômio segurança e qualidade17.

Ademais, a segurança expressa neste inciso está ligado não somente a saúde ou vida do consumidor, mas também acerca de seu patrimônio.


B) Direito a Educação, Informação e Liberdade de Escolha.


O inciso II, do CDC, estabelece ser direito básico do consumidor a “educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas à liberdade de escolha e a igualdade nas contratações”.

No inciso III, estabelece de forma ampla o direito a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta das características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.

O direito à educação previsto no Código de Defesa do Consumidor é diverso do previsto na CFB/88, sob o prisma social. Naquele quis tutelar o direito a educação para o consumo adequado dos produtos e serviços colocados no mercado de consumo. Já este, quis tutelar a educação voltada para o desenvolvimento do cidadão e da sociedade como um todo.

Os dois institutos não divergem, ao contrario, até se complementam, pois ambos estão ligados ao direito a informação. Não há educação sem informação.

Todavia, a maior garantia deste inciso II, é a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações. O Código de Defesa do Consumidor construiu um verdadeiro arcabouço de proteção do consumidor no que tange aos contratos, inclusive com direito a modificação de clausulas abusivas.

A liberdade de escolha é instituto, de regra, pré-contratual, fenômeno possível nos casos de contratos de ensino superior e observável com mais nitidez na fase de escolher com quem será contratado e o curso que será escolhido pelo consumidor. Isto é, no vestibular, o consumidor escolhe a instituição de ensino que ira contratar e o curso, nos termos da oferta de cursos da instituição.

Mas é possível no momento da contratação ou no decorrer da vigência do contrato, o consumidor ainda tenha a liberdade de escolha. Por ser contrato de adesão, os contratos de prestação de ensino superior dão pouca margem de liberdade de escolha do consumidor, porém há dois casos que divergem desta regra. O primeiro caso é o referente aos tipos de contrato de ensino superior. Os contratos podem ser do tipo aberto ou fechado, ou chamados de grade aberta ou grade fechada ou por créditos.

Os primeiros, por liberalidade da instituição, são passiveis de escolha do consumidor acerca das disciplinas que serão cursadas. Neste ponto um fato que tem trazido problemas contratuais é acerca dos valores pagos pelas disciplinas cursadas ou pelos créditos. Isto é, seria correto que uma instituição de ensino superior cobre o valor integral da mensalidade mesmo que o aluno não esteja cursando a grade completa de disciplinas? Para a solução deste problema deve-se ater apenas ao princípio da proporcionalidade consubstanciado no art.6 °, V. Assim, os valores cobrados devem ser proporcionais os serviços prestados. O parâmetro para se observar qualquer desproporcionalidade é simples, basta ter em mente o quantum do que seria pago se o consumidor estivesse cursando todas as disciplinas ou estivesse pagando todos os créditos.

Sobre este tema, não é demais lembrar o posicionamento do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça qual seja: “As instituições de ensino possuem autonomia administrativa no que se refere ao estabelecimento dos valores cobrados por seus serviços, contudo, o valor da mensalidade deve guardar correspondência com o serviço prestado. Assim, o valor estipulado para a mensalidade de um aluno que cursa todas as disciplinas da grade curricular não pode ser o mesmo da mensalidade estipulada para um aluno que esteja cursando apenas uma ou duas matérias. A cobrança do valor integral da mensalidade para o aluno que não está cursando todas as disciplinas da grade curricular pode ser caracterizada como uma prática abusiva, uma vez que isto fere o princípio da proporcionalidade, que está traduzido nos direitos básicos do consumidor no Art. 6º, V, do Código de Defesa do Consumidor.” 

Já os contratos de tipo fechado ou de grade fechada, não há liberdade de escolha para as disciplinas a serem cursadas. A instituição de ensino superior, no exercício de seu direito de autonomia didática, fixa as disciplinas que serão cursadas no ano ou semestre letivo e o quantum que será pago, tendo em vista o que determina a Lei de Mensalidades Escolares.

Outro caso em que o consumidor tem poder de escolha é no decorrer da execução do contrato, é solicitado à transferência de instituição de ensino ou de curso.


C) Direito à Informação.


È direito básico do consumidor a informação clara e adequada sobre produtos e serviços, com especificação correta de características e preço (art. 6°, III, do CDC).

Assim, antes mesmo do consumidor adquirir ou utilizar qualquer produto ou serviço, põe-se a salvo seus direitos. Exposto às práticas comerciais antes mesmo de estabelecer negócios jurídicos, sob a égide do CDC (art. 29), o consumidor tem direito de ser informado, ainda no momento pré-contratual ou no momento da oferta. Antonio Herman de Vasconcelos e Benjamin18 ensina que “o consumidor é, então, não apenas aquele que adquire ou utiliza produto ou serviço, mas igualmente as pessoas expostas as práticas previstas em Lei como no caso da oferta”.

Vale dizer, o consumidor em potencial – aqueles candidatos ao vestibular etc. – são protegidos pela norma antes mesmo de se estabelecer à relação jurídica contratual.

A importância da informação prévia ao consumidor para o estabelecimento contrato, é a de impossibilitar ao máximo a utilização de má-fé por parte das instituições de ensino e dos fornecedores em geral, no momento de ofertarem seus serviços.

Para impedir que o consumidor seja pego de surpresa no momento estabelecer o contrato ou utilizar o serviço, o CDC, determina que as informações suficientemente precisas ou publicidade veiculada por qualquer meio de comunicação com relação ao serviço oferecido ou apresentado, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado (art.30, caput, CDC). Isto é, fica o fornecedor vinculado à publicidade que veicular ou utilizar.

Este texto do art. 30 deve ser relacionado com o conceito de consumidor do art. 29. se a oferta expressa uma proposta irretratável, recusando-se o fornecedor a contratar, o consumidor, porque exposto a essa oferta (= proposta), pode compelir o fornecedor a efetivar o negócio19.

Coerente com este artigo 30, o Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 48, determina que “as declarações de vontade constantes de escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações de consumo vinculam o fornecedor, ensejando inclusive execução específica, nos termos do art.80 e parágrafo único”.

O consumidor, assim, recebe proteção antes mesmo de se estabelecer a relação contratual com IES. No caso dos contratos de prestação de serviços de ensino superior particular, antes mesmo do vestibular as obrigações do fornecedor contidas em escritos particulares, publicidade quaisquer informações suficientemente precisas deverão constar nos contratos que vierem a ser celebrados. O usuário em potencial destes serviços de ensino superior somente pode exigir a transposição das obrigações dos fornecedores veiculadas ainda no momento pré-contratual para o contrato, sob a condição suspensiva da aprovação do processo seletivo prévio (vestibular).

Em atenção ao amplo direito do consumidor de ser informado acerca dos serviços, preços etc. o estabelecimento de ensino deverá divulgar, em local de fácil acesso ao público, o texto da proposta de contrato, o valor apurado na forma do art. 1° (referente as mensalidades escolares), e o numero de vagas por sala-classe, no período mínimo de quarenta e cinco dias antes da data final para matrícula, conforme calendário e cronograma da instituição de ensino (art.2°, da Lei 9870/90).


D) Proteção Contra Publicidade Enganosa e/ou Abusiva.


O consumidor tem direito à proteção contra a publicidade enganosa ou abusiva (art.6°, IV, primeira parte). Corolário do direito a informação, não seria razoável que o consumidor não fosse protegido de tal publicidade.

Assim, para tal resguardo ao consumidor, o CDC, determinou ser defeso toda a publicidade enganosa ou abusiva (art.37). O mesmo diploma conceitua o que vem a ser enganosa ou abusiva no §1° e 2°, do citado artigo.

É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre os produtos e serviços (§1°, art.37, CDC).

Do conceito observa-se que publicidade é toda modalidade de informação destinada ao consumidor, com intuito de divulgar determinado produto ou serviço. Já a publicidade enganosa é aquela falsa, que não é só a inverídica, mas também aquela capaz de induzir o consumidor em erro.

É enganosa por omissão, conforme se observa do §3°, do art.37, que a publicidade que deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço.

Desta forma, no caso das instituições de ensino superior privado, as afirmações veiculadas em formas publicitárias, de que dispõe os melhores profissionais, os melhores cursos, estas informações devem corresponder a verdade, sob pena de praticar publicidade enganosa. E mais, em vista ao direito de ser informado de clara e adequada, a omissão de dado fundamental, capaz de induzir o consumidor em erro também constitui publicidade abusiva.

A utilização desta prática abusiva em demasia levou o legislador a tipificar como crime fazer promover publicidade que sabe ou deveria ser enganosa ou abusiva.

Já a publicidade abusiva é a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite á violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.

A importância deste tema para a proteção contratual do usuário do serviço de ensino superior encontra-se, também, no princípio da vinculação do fornecedor ao que veiculou em oferta (art.30, CDC).


E) Direito a Proteção Contratual.


Passando pela liberdade de escolha do consumidor a outra garantia do consumidor, prevista neste inciso II, do art.6°, é a igualdade nas contratações. Para a efetiva igualdade nas relações contratuais é necessário impor-se restrições na liberdade de contratar, neste sentido os incisos IV e V, do art.6°, do CDC, corrobora com a determinação do inciso II, dispondo ser direito básico do consumidor a proteção contra clausulas abusivas e determina que o consumidor tem direito a ver modificada as cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que os tornem excessivamente onerosas.

Para dar cumprimento a garantia do consumidor de ser protegido contra clausulas abusivas nos contratos o Código de Proteção do Consumidor elencou um rol exemplificativo de cláusulas abusivas em seu art.51. Este rol será tratado com mais profundidade em tópico específico. Todavia, faz-se mister tratar de forma geral acerca da proteção contra clausulas abusivas.

Sendo elenco exemplificativo, é importante observar que é possível estabelecer outras cláusulas desproporcionais. A expressão “entre outras” do caput do art.51 evidência o critério da Lei de mencionar em números apertus os casos de cláusulas abusivas nos contratos de consumo. Assim, é possível que o Judiciário ante a clausula que imponha desequilíbrio em determinada relação de consumo, pode declarar sua nulidade considerando-a abusiva. Ademais, os órgãos administrativos de defesa do consumidor também podem estabelecer novas cláusulas que estes entendam ser abusivas e nulas de pleno direito. O Ministério da Justiça, por meio do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor – DPDC, da Secretaria de Direito Econômico – SDE divulga, anualmente, elenco complementar de cláusulas contratuais consideradas abusivas (Decreto 2181/97)

Alem de estabelecer um rol de cláusulas abusivas, o CDC em seu art.39, estabeleceu as praticas vedadas aos fornecedores de serviços, tais como a prática de venda casada, vender serviço sem a devida solicitação do consumidor, ou ainda recusar atendimento às demandas dos consumidores, ou recusar a prestação de serviços a quem se disponha adquiri-los mediante pronto pagamento. Estas práticas são abusivas mesmo que embasadas em contrato, e se reputariam, também, nulas de pleno direito.

Nota-se assim, que o rol exemplificativo de praticas e cláusulas abusivas assentam-se no princípio basilar das relações jurídicas de consumo que é o da boa-fé, e o CDC, optou expressamente por este primado nas relações contratuais, quando optou pela proibição das cláusulas que sejam incompatíveis com a boa-fé ou equidade (art.51, IV).

Deveras, no que respeita aos aspectos contratuais da proteção do consumidor, o CDC rompe com a tradição do direito privado, cujas bases estão assentadas no liberalismo que reinava na época das grandes codificações européias do séc. XIX20. Neste momento, o princípio da intangibilidade do conteúdo do contrato dogmatizado pelo brocado pacta sunct servanda atendia as necessidades de uma sociedade liberal e individualista, que em termos econômicos o ponto fundamental era a autonomia da vontade sobre tudo.

Todavia, estas regras tradicionais do direito privado não mais atendem as necessidades da sociedade, quando se trata de negócios jurídicos, realizados ou não sob o modo de contratos de adesão ou contratos de massa. Assim, o Estado passou a intervir na liberdade de contratar, tornando mais relativo à aplicação do princípio da intangibilidade e instituindo o princípio da boa-fé nas relações de consumo.

No Brasil, a intervenção do Estado nas relações de consumo se tornou patente e obrigação constitucional a partir de 1988. O estado na forma da lei deverá promover a defesa do consumidor (art.5, XXXII, da CF/88).

A proteção do consumidor não cumpriria seu objetivo se não passasse pela proteção do contratual, e o CDC não ficou alheia a este mister. É importante frisar que a Lei de Proteção do Consumidor não se limitou a estabelecer um números apertus de cláusulas abusivas, mas deu nova óptica para a interpretação e validade do contrato.

O art. 46, do CDC, determina que os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada à oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.

A aplicabilidade deste dispositivo se faz mais presente nos casos de contratos de adesão, e especialmente nestes contratos, as clausulas que restritivas de direitos do consumidor deverão vir em destaque (art. 54, §4°, do CDC).

Todavia, resultaria inútil este dispositivo se o CDC, não desse outra vertente para a interpretação dos contratos principalmente os de adesão. É obvio que o fornecedor via de regar tem condições de redigir um contrato de forma clara e sem ambigüidades, todavia, alem disso, para evitar problemas na interpretação do contrato (caso em que o fornecedor redija de má-fé ou que redija com inépcia), o mesmo será interpretado de maneira mais favorável ao consumidor. Exatamente por isto o CDC, em seu art.47, determina que as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor. Ademais atendendo as novas demandas da sociedade o Código Civil em seu art.423, fixa que quando houver, nos contratos de adesão, cláusulas ambíguas ou contraditórias dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.

Os contratos de ensino superior particular são não fogem as estas regras e os usuários destes serviços estão protegidos legalmente tanto pelas normas cogentes do CDC e ainda de leis aplicáveis a estes contratos.

Sendo estes contratos estipulados sob a forma de adesão poderá fazer uso dos benefícios do CDC, tais como conhecimento prévio do conteúdo do contrato e ainda a revisão de cláusulas que estabeleçam prestações desproporcionais ou que causem desequilíbrio nas relações contratuais de prestação de serviços de ensino superior particular.


F) Eficiência e Qualidade na Prestação de Serviços.


Além destes direitos já elencados, o consumidor tem direito a eficaz prestação de serviços públicos. O art.6º, X, do CDC assim determina: “Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos” (art.22, do CDC).

A prestação de serviços educacionais não pode ser considerada de outra forma senão como serviço público, e como tal, deve ser prestada de forma eficaz e adequada.

Atente-se que os serviços educacionais não se resumem as aulas lecionadas durante o curso, mas também, o atendimento nas secretarias, tesourarias e bibliotecas.

Sobre os serviços administrativos prestados por instituições de ensino, um dos grandes indagações dos usuários destes serviços referem-se a possibilidade de cobrança de “taxas” por serviços de fornecimento de declaração escolar, histórico e outros. Para esta dúvida, a resposta é a de que, em vista a autonomia financeira das instituições de ensino superior, prevista na CF/88, as mesmas podem dispor acerca dos valores destas “taxas”. Contudo, a Portaria 971/97, do MEC, determina que estes valores devem estar previstos no Catálogo da Instituição, documento que deve estar disponível para livre consulta de qualquer interessado. 

Esta autonomia no que se refere aos valores cobrados por estes serviços, não é plena. Para a estipulação destas, as instituições de ensino devem estar atentos ao princípio da proporcionalidade previsto no CDC. Caso pareçam excessivo estes valores, o aluno, pai ou responsável pode propor ação para revisão destes preços, alem de levar o fato a conhecimento do Ministério Público para providências cabíveis.



CAPITULO VI

DA MATRÍCULA


Os contratos de ensino superior particular são contratos de adesão (art.54. CDC) e como tais, suas cláusulas são estabelecidas pela instituição de ensino. Para a perfeição deste contrato é necessário à adesão do consumidor. Esta adesão denomina-se matrícula.

Confunde-se muito a matrícula com o pagamento da primeira mensalidade, quando esta é apenas uma condição para o estabelecimento do instrumento.

Faz-se necessário lembrar que a Lei de Mensalidades Escolares determina que o valor total, anual ou semestral, será pago em seis ou doze parcelas, de acordo com o regime estabelecido. Assim, a primeira mensalidade, que via de regra é paga nos meses de janeiro e julho, equivalem à taxa para a efetivação da matrícula.

Neste período em que é feita a matrícula, em regra, não há prestação de serviços de ensino, propriamente dito.

Um dos maiores problemas surgidos com referência a matrícula e a primeira mensalidade, refere-se ao aluno que desiste de freqüentar o curso após a efetivação da matrícula. Este aluno teria ou não direito à devolução da primeira mensalidade que é paga a titulo de matrícula?

O Judiciário e os órgãos do SNDC são unânimes no entendimento de que o aluno tem direito à devolução dos valores pagos a titulo de matrícula.

A razão é bem óbvia. O CDC determinou ser nula de pleno direito a clausula contratual, que estabeleça desvantagem exagerada ao consumidor (art.51, IV), e a cláusula expressa de não devolução da primeira mensalidade, deve ser afastada do contrato com declaração de nulidade de pleno júri, em vista que estabelece vantagem exclusiva em favor da instituição de ensino.

O efeito de que o contrato faz lei entre as partes (pacta sunct servanda), já não tem mais aplicabilidade absoluta e foi mitigado em nosso atual ordenamento jurídico. Os contratos na atualidade devem atender a sua finalidade social sendo aplicáveis os princípios da boa-fé e equidade.

Isto é, não se pode pactuar contra a lei. Embora esteja previsto no contrato a não devolução, em vista a sua desproporcionalidade entre o pagamento e a utilização do serviço que não ocorreu, a clausula deve ser considerada nula.

Frise-se que no período de matrícula não há prestação de serviços educacionais, mas apenas os serviços de secretaria, onde há apenas preenchimento de fichas e assinatura do termo do contrato, que não podem equivaler a perda de uma mensalidade integral. Foi o que entendeu o Tribunal de Justiça do DF no julgamento da Apelação Civil no Juizado Especial, proc. N° 2000 01 1 052538-9.

Em vista a prestação de serviços administrativos no momento da matrícula, a jurisprudência tem entendido que o fornecedor pode reter até 10% (dez por cento) do valor pago a titulo de matrícula, como contraprestação a este serviço de secretaria.




CAPÍTULO VII

DAS CLAUSULAS ABUSIVAS


O Código de Defesa do Consumidor elencou em seu art. 51 um rol exemplificativo de cláusulas contratuais abusivas e as fulmina de nulidade.

O Caput deste artigo assim declara: “São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços...”.

O legislador entendeu que algumas cláusulas contratuais ofendem a ordem publica e a proteção do consumidor, e elaborou um micro sistema de nulidades próprio, afastando-se do sistema de nulidade do direito civil, lembrando que a nulidade de cláusulas abusiva sempre depende de declaração judicial para deixar de ter validade21.

A expressão “entre outras” descrita no caput do art.51, nos faz levar a conclusão de que o rol de cláusulas abusivas é exemplificativo, podendo o juiz sempre que estiver diante de cláusula que evidencie desequilíbrio entre as partes numa relação de consumo poderá declara-la nula de pleno júri.

Este entendimento é importante, pois a Lei de Mensalidades veda algumas práticas abusivas, por parte da instituição de ensino superior, e se estas estiverem prevista em contrato, poderão ser atingidas por declaração de nulidade.

É relevante frisar que a nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes (art.51, §2°, CDC).

Passamos ao numero taxativo de clausulas abusivas do artigo em questão.


[1] O inciso I, do art. 51, determina que ser abusiva e nula de pleno direito a clausula contratual que impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem em renúncia ou disposição de direitos.

O CDC determina que a responsabilidade civil dos fornecedores de produtos e serviços é objetiva (arts. 8° e 10), e por ser as normas do Código de ordem pública, não pode o fornecedor se eximir de sua responsabilidade legal em face do contrato.

Pelo mesmo princípio o consumidor também não pode renunciar em contrato o direito de indenização por danos causados por fornecedor.

Todavia, a parte final deste inciso I, atenua a proibição em tela, dispondo ser possível a limitação de indenização, em situações justificáveis, quando a relação de consumo for estabelecida entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica.


[2] É nula de pleno direito a cláusula contratual que subtraia do consumidor a opção de reembolso da quantia já paga nos casos previstos neste caso de acordo com o inciso II deste art.51.

Três são os principais casos de que o consumidor tem a opção de reembolso, no CDC, quais sejam, nos casos de vício de produto ou serviço (art. 18 e 20), nos casos de descumprimento da oferta (art.35, III) e ainda nos casos em que o consumidor contrato fora do estabelecimento, no prazo de sete dias a contar da assinatura do contrato ou da entrega do produto ou da prestação do serviço (art.49).

Todavia, há outros casos de opção de reembolso da quantia eventualmente paga pelo consumidor que não estão presentes expressamente no CDC, mas que fazem necessário que o consumidor tenha este direito para manter o equilíbrio contratual e principalmente na relação jurídica de consumo estabelecida.

Foi o que ocorreu com nos contratos de ensino superior particular. A jurisprudência e o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor – SNDC, entendeu que a primeira parcela paga pelo consumidor a titulo de matrícula, no caso de desistência do curso pelo aluno, deve ser restituída. Contudo, a instituição de ensino poderá reter um percentual do valor total pago, com o fim de cobrir possíveis despesas administrativas incorridas pela instituição de ensino22.

[3] A clausula que transfira a responsabilidade a terceiros também é abusiva (inciso III, do art.51). Frise-se que a responsabilidade é solidária das pessoas que participaram da cadeia produtiva e mercantilista até chegar ao consumidor nos termos do art.7° c/c os arts. 18 e 20 do CDC.


[4] São abusivas as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou seja, incompatível com a boa-fé e equidade (art. 51, IV). O próprio CDC estabelece as diretrizes para se determinar o que vem a ser vantagem exagerada, dispondo em seu art.51, §1°, que é exagerada a vantagem que ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertença; restringe direitos e obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; e ainda a cláusula que se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

Todas as outras previsões de cláusulas abusivas decorrem deste inciso IV, pois este prevê expressamente que se deve atender aos princípios da boa-fé e equidade nas relações contratuais. Princípios que permeiam boa parte dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor.

Nos contratos de ensino e em outros contratos de consumo, as cláusulas que sejam infensas a estes princípios, causando desvantagem exagerada em face do consumidor, são eivadas de nulidade.


[5] As cláusulas que estabeleçam a inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor e ainda as que determinem a utilização compulsória de arbitragem, são nulas de pleno direito (art. 51, VI e VII), também são nulas. Estas são duas garantias processuais do consumidor. A primeira decorre do direito básico do consumidor de ver facilitada a defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a sei favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência (art.6°, VIII). A segunda garantia decorre do direito de acesso as órgãos judiciário e administrativos (art.6°, VII).


[6] Também, são consideradas nulas as cláusulas que imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor ou ainda deixem o fornecedor à opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor (art.51, VIII e IX). Neste momento vê-se a preocupação da lei em dirigir o contrato de consumo para o ponto de equilíbrio ideal entre o fornecedor e consumidor23.


[7] Será também nula de pleno direito a cláusula contratual que permita ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral (inciso X, do art.51).

Após a assinatura do contrato não pode o fornecedor a seu talante alterar o valor estipulado do contrato. Isto poderia desequilibrar a relação jurídica de consumo.

A Lei de Mensalidades corrobora com este proibitivo do CDC. Esta Lei, dentre outras coisas, determina em seu art. 1º, § 4º que é proibido o reajuste do valor das parcelas da anuidade ou semestralidade escolar em prazo inferior a um ano, a contar da data da sua fixação, salvo quando expressamente previsto em lei.

Neste caso a própria Lei em seu art.1°, determina que o valor total a ser pago pelo serviço será dividido em seis ou doze parcelas variando de acordo com o regime. Assim, percebe-se que o contrato via de regra tem vigência de um ano, ao menos para efeito de aumento das parcelas.


[8] Não é permitido, ainda, que o fornecedor cancele o contrato de forma unilateral, sem que igual direito seja conferido ao consumidor (inciso XI, do art.51).


[9] Da mesma forma, a cláusula contratual que obrigue o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor é nula (art.51, XII). Assim, é possível que a instituição de ensino passe a cobrança para escritórios especializados os quais estabelecem “taxas” referente aos custos da cobrança, todavia, esta situação deve estar prevista no contrato e igual direito deve ser conferido ao consumidor.

[10] O Código jamais poderia atender a um de suas finalidades que é a do equilíbrio do contrato se não proibisse que o fornecedor viesse a modificar o conteúdo ou a qualidade do contrato de forma unilateral, após a sua celebração (art.51, XIII).

Ocorre porem, que ainda é possível observar a desobediência deste dispositivo, também nos casos de contratos de prestação de serviços de ensino superior particular.

Muitas vezes as instituições de ensino superior modificam a grade curricular de seus cursos, e alteram o conteúdo e por vezes até a qualidade do contrato. Deveras, as instituições de ensino superior possuem autonomia didática (art. 207, CF/88) e podem modificar a sua grade curricular, entretanto, esta alteração não pode alcançar os contratos já firmados e em vigência, salvo quando esta modificação ocorrer a partir da vontade das partes, ou seja, de forma bilateral.


 


CAPITULO VIII

DAS MENSALIDADES


Passando pela matrícula e os termos do contrato, a questão que mais preocupa os usuários dos serviços de ensino é as mensalidades escolares ou mais especificamente os valores das anuidades ou semestralidades.

Estes valores são regulados pela Lei 9870/99 (Lei de Mensalidades Escolares).

O art.1° da referida lei dispõe que o valor total das anuidades ou semestralidades escolares do ensino pré-escolar, fundamental, médio e superior, será contratado, nos termos desta Lei, no ato da matrícula ou da sua renovação, entre o estabelecimento de ensino e o aluno, o pai ou responsável.

Neste caso, o aluno ou seu responsável, paga um valor total anual ou semestral de acordo com o regime, pelos serviços de ensino superior.

Para a fixação deste valor total anual ou semestral, o estabelecimento de ensino tem por base a ultima parcela da anuidade ou semestralidade fixada no ano anterior, multiplicada pelo numero de parcelas do período letivo (art.1°, §1°, da Lei de Mensalidades).

Todavia, o consumidor não paga de uma vez o valor total da semestralidade ou anuidade, pois este valor é parcelado de acordo com o regime adotado pelo estabelecimento de ensino. O §3°, do art.1°, da citada lei, determina que o valor total anual ou semestral, apurado na forma desta lei, ou seja, na forma do §1°, terá vigência de por um ano e será dividido em doze ou seis parcelas mensais iguais.

Assim, as mensalidades correspondem ao valor total, que é dividido por força da Lei, em seis ou doze parcelas iguais.

Não pode a instituição de ensino cobrar valores diferentes de mensalidades, as parcelas devem ser iguais.

Ocorre, entretanto, que algumas instituições cobram no momento de efetivar a matricula, alem da primeira parcela da anuidade ou semestralidade, uma “taxa de matricula”. Esta cobrança figura-se como abusiva, pois como visto, os valores totais das anuidades ou semestralidades devem ser divididos em parcelas mensais iguais, e a primeira mensalidade refere-se a matricula. Esta parcela é paga no período em que não há prestação de serviços de ensino em si, mas apenas serviços de secretaria.

Destarte, estes serviços são perfeitamente cobertos pela primeira parcela paga a titulo de matricula, ou seja, não é permitida a cobrança da “taxa de matricula”, além da primeira mensalidade, visto que esta mensalidade já serve para cobrir os serviços administrativos referentes a efetivação matricula.

Outro ponto que, também, preocupa os usuários dos serviços de ensino superior particular é a questão do aumento das mensalidades. Todos os anos, é comum, vermos que as instituições de ensino superior venham a aumentar os valores das mensalidades, e surge sa seguintes indagações: É legal o aumento das mensalidades? De quando em quando é possível este aumento?

A Lei de Mensalidades definiu alguns parâmetros para este aumento e as normas desta lei devem ser conjugadas com o CDC.

Segundo a Lei de mensalidades os valores totais anuais ou semestrais, terão vigência de um ano (art.1°, §1°) e neste diapasão, o CDC, determina em seu art.51, X, ser abusiva a cláusula que permita ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral. Destarte, no período de vigência do contrato, que é de um ano, os valores das semestralidades ou anuidades não poderão ser variados.

É o que determina a Lei 9870, no §4°, do art.1°, em harmonia com o CDC, quando declara se nula, não produzindo qualquer efeito, cláusula contratual de revisão ou reajustamento do valor das parcelas da anuidade ou semestralidade escolar no prazo inferior a um ano a contar da data de sua fixação, salvo quando expressamente prevista em Lei.

O art. 2° da Lei de Mensalidades determina que os estabelecimentos de ensino devem divulgar, em local de fácil acesso ao público, o valor do aumento em suas mensalidades escolares, com antecedência mínima de 45 dias da data da matrícula24.

A legalidade do aumento das mensalidades escolares, esta, assim, condicionada ao prazo anuo de vigência do contrato. Isto é, não se pode revisar ou reajustar, de forma unilateral, os valores das anuidades ou semestralidades em período inferior a um ano a contar da data da assinatura do contrato, e ainda, o aumento das mensalidades devem ser divulgada em lugar de fácil acesso, 45 dias antes da data da assinatura do contrato, atendendo ao direito básico do consumidor de ser informado (art.6°, III, CDC).

Quanto ao valor ou porcentagem do aumento, é de se notar que a regra é não haver tabelamento de preço de produtos e serviços no país. Todavia, os estabelecimentos de ensino não podem majorar os valores apenas a seu talanto. O art. 39, X, do CDC, veda aos fornecedores de produtos e serviços elevar sem justa causa o preço dos produtos e serviços.

Com isso, a Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, por meio do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, quando necessário poderá requerer, nos termos da Lei 8078/90, e no âmbito de suas atribuições, comprovação documental referente a qualquer cláusula contratual, exceto dos estabelecimentos de ensino que tenham firmado acordo com os alunos, ou responsável, ou associação de pais e alunos, devidamente legalizadas, bem como quando o valor arbitrado for decorrente de decisão de mediador (art.4°, da Lei 9870/99).

Em atenção ao art.4°, do Decreto 2181/97, que regulamenta o CDC, a competência prevista para a Secretaria de Direito Econômico se estende aos órgãos de defesa do consumidor no âmbito dos Estados e Municípios – PROCONs. Assim, os Procons podem, no âmbito de suas atribuições, requerer das instituições de ensino superior documentação que comprove a justificativa para o aumento das mensalidades. O Ministério Público também pode requerer tal documentação.

Quando a documentação apresentada pelo estabelecimento de ensino não corresponder às condições desta Lei, os órgãos acima referidos, poderá tomar, dos interessados, termo de compromisso, ou termo de ajustamento de conduta, na forma da legislação vigente (parágrafo único, do art. 4°, da Lei 9870/99).




CAPITULO IX

DA INADIMPLÊNCIA


A proteção do consumidor deve se dar antes durante e depois da formação da relação de consumo25. Ocorre demasiadamente o inadimplemento das obrigações nas relações jurídicas de consumo, por vários motivos – juros autos, inflação, desemprego, redução de salários, instabilidade econômica, práticas abusivas, enganosas ou injustas no mercado de consumo – fatores que afligem a muito a história de nosso país e de países emergentes.

Hoje, 55% dos alunos do setor privado do ensino superior vêm de famílias com menos de 5 salários mínimos. Projeta-se, em cinco anos serão 75%. Os 3 milhões de estudantes do ensino superior serão 5 milhões, correspondendo a 20% da população de até 24 anos. Haverá 75% egressos de famílias pobres26.


I – Cobrança Abusiva.


O consumidor, ante a esta situação, por muito ficou desprotegido, ficando submetido a abusos em cobranças de dividas.

Naturalmente o credor quer receber o que lhe é de direito.Todavia, é vedado ao fornecedor agir com abuso nas cobranças.

Uma ação judicial seria o caminho natural para a cobrança, porem, face aos obstáculos inerentes ao processo, esta opção não é a primeira do fornecedor. Por conta da demora e alto custo de um processo judicial, os fornecedores preferem cobrar extrajudicialmente.

É exatamente aí – na fase extrajudicial – que ocorre abuso nas cobranças. Para minimizar esta situação o Código de Defesa do Consumidor em seu art.42, dispõe que na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente ao será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

Em harmonia com este dispositivo, o art.71, do CDC, tipifica como crime a utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer.

O dispositivo alcança não só o credor, mas também empresas especializadas em cobrança.

Contudo, em sede de contratos de prestação de serviços educacionais, não foi suficiente o CDC, pois os estabelecimentos de ensino, ainda utiliza de práticas abusivas na cobrança de dívidas, com penalidades pedagógicas que colocavam o aluno em situação de ridículo e/ou constrangimento físico ou moral.

Desta forma, o art.6° da Lei 9870/99 expressamente proíbe a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento, sujeitando-se o contratante, no que couber, as sanções legais e administrativas, compatíveis com o CDC, e com o Código Civil, caso a inadimplência perdure por mais de noventa dias.

Não pode, assim, a instituição de ensino superior suspender a aplicação de provas e nem mesmo pode reter documentos de interesses dos alunos, bem como aplicar penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento. Isto atende ao que determina o art.42, do CDC, que proíbe a exposição a ridículo o consumidor ou submete-lo a constrangimento.

Uma das principais penalidades pedagógicas aplicadas nestes casos de inadimplemento é a de impedir o aluno de freqüentar as aulas, seja restringindo a sua entrada no estabelecimento de ensino, seja retirando o aluno de sala de aula.

Estas práticas são por demais abusivas, pois coloca o consumidor em exposição ao ridículo frente aos colegas de curso, bem como, o submete a constrangimento ilegal. Também não é razoável esta prática, tendo em vista que os contratos devam ser mantidos até o termino de sua vigência.


II – Renovação de Matrícula.


Após o prazo de vigência do contrato, os estabelecimentos particulares de ensino superior não são obrigados a efetuar a renovação de matrícula do aluno inadimplente (art.5º, da Lei 9870/99).

Neste dispositivo, ficou presente o forte lobby das instituições de ensino particulares. Durante o período de discussão da Lei de Mensalidades Escolares, um dos pontos mais discutidos foi este referente à renovação da matrícula, pois as instituições de ensino particular teriam outros meios de forçar o adimplemento por parte dos alunos ou seus responsáveis, tais como, a cobrança judicial ou extrajudicial nos limite da Lei.

Levando em consideração o direito constitucional a educação ou ao ensino – que ora se divide em ensino básico, fundamental, médio e superior – as instituições de ensino superior não poderiam recusar a renovação dos alunos que se encontram inadimplentes, mesmo porque, os estabelecimentos de ensino têm outros meios legais de cobrança das mensalidades em atraso. Ademais, o legislador não se atentou a realidade da sociedade brasileira frente a universalização do ensino superior, e não observou os motivos que levam a de fato a inadimplência.

Também no caso de atraso nas mensalidades as instituições somente podem cobrar multa moratória de 2%, do valor da mensalidade conforme dispõe o art.52, §2°, do Código de Defesa do Consumidor. No mesmo sentido dispõe a Portaria n° 03/99 da Secretaria de Direito Econômico, quando declara ser nula a clausula contratual que estipula multa superior ao limite legal.

Alem da multa moratória as instituições de ensino podem cobrar juros de mora, alem de correção monetária.

III – Prescrição.


O Código Civil de 1916 determinava ser anua a prescrição para a cobrança de mensalidades escolares de alunos inadimplentes (art.178, §6°, VII). O Superior Tribunal de Justiça, já havia assentado a jurisprudência neste sentido.

Todavia, com o advento do Novo Código Civil, este prazo passou a ser de cinco anos.

O art.206, §5°, I, do Código de 2002, dispõe que prescreve em cinco anos a pretensão de cobrança de dívidas liquidas constantes de instrumentos público ou particular.

Em vista a revogação do “Código de Bevilaqua”, o prazo para a cobrança de mensalidades escolares passou a ser de cinco anos.

Desta forma, para os contratos firmados e as mensalidades que ficaram em atraso anteriormente a vigência do Novel Código Civil, o prazo prescricional é de um ano. Para os outros contratos de ensino superior particular o prazo é de cinco anos.



CAPITULO – X

EPÍLOGO


De todo o exposto podemos extrair a seguintes considerações:


  • Vimos que a evolução dos contratos trouxe a tona uma nova concepção de contrato, isto é, os contratos não poderiam mais ser visto apenas para atender as expectativas mercantilistas, mas as suas finalidades sociais o que Miguel Reale chama de socialidade do direito.

  • Com esta noção nova noção de contrato os princípios pacta sunct servanda foram mitigado para a aplicação dos princípios da boa fé, equidade e da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo.

  • Os contratos de ensino superior particular devem ater-se a tais princípios. Estes contratos classificam-se como bilateral ou sinalagmático, principal, escrito, mas não solene, de execução periódica e de adesão.

  • A Lei de Mensalidades Escolares (Lei n° 9870/99) e o Código de Defesa do Consumidor (Lei n° 8078/90) regulam estes contratos, estabelecendo a forma de pagamento das mensalidades escolares e o regime de cumprimento da prestação dos serviços educacionais.

  • Ademais a lei de mensalidades escolares na esteira do Código de Proteção do Consumidor estabelece os direitos dos alunos usuários dos serviços de ensino superior e ainda dos ensinos (básico e médio).

  • Tais leis foram criadas e postas em vigência para tornar as relações entre consumidores e fornecedores mais equânimes e, no caso específico dos serviços de ensino superior, resolver distorções que afligem os alunos usuários destes serviços. Há muito, estes problemas existem, mas somente após a explosão e aceleração da privatização do ensino superior é que estes problemas se tornaram mais patente.

  • O objetivo deste trabalho era justamente trazer o lume, a depuração destes fatos e suas possíveis soluções. Para tanto, definimos os sujeitos que participam desta relação jurídica e quais recebem a tutela do Estado e os principais problemas. Participam as instituições de ensino superir particular e os alunos parte mais fraca nesta relação e sujeito a proteção especial do Estado nos termos do art. 5°, XXXII, da CF/88.

  • Os principias problemas enfrentados pelos alunos são referentes a matrículas, os serviços que não atendem a sua finalidade e ainda problemas acerca de inadimplência.

  • Após definirmos as partes desta relação contratual, definimos os seus direitos, de forma que seja mais fácil tratar dos problemas.

  • Vimos que os direitos dos alunos usuários dos serviços de ensino superior estão adstritos ao Código de Defesa do Consumidor e a Lei de Mensalidades Escolares. De forma geral o consumidor tem direito: a vida, saúde segurança; a liberdade de escolha a educação, e a informação precisa e clara; direito a proteção contra a publicidade enganosa; direito a proteção contratual, com igualdade nas contratações e proteção contra cláusulas abusivas; a proteção contra danos morais e materiais.

  • Todos este direito podem incidir diretamente nas relações jurídicas estabelecidas entre as instituições de ensino superior e seus alunos e estabelecem um norte para a solução das divergências que podem surgir entre as partes.

  • Neste compasso, o aluno tem direito no momento da matrícula, isto é de estabelecer o contrato, igualdade nas contratações. Também no momento da matricula o aluno tem de pagar a primeira mensalidade (§2°, do art.1° da Lei 9870/99). Esta mensalidade, que via de regra é paga nos meses de janeiro e julho, equivale à taxa para a efetivação da matrícula. Vimos que após a efetivação da matricula, caso o aluno desista de freqüentar o curso, este tem direito de requerer os valores pagos a titulo de efetivação de matrícula, podendo a instituição reter parte dos valores para cobrir custos administrativos.

  • Nesta relação jurídica estabelecida entre a instituição e o aluno, o Código de Defesa do Consumidor estabeleceu um sistema de nulidades próprio com o fim de dar efetividade ao direito do consumidor ser protegido contra cláusulas abusivas. Em síntese, o aluno tem direito de ver modificada todas as cláusulas que estabeleçam obrigações desproporcionais que causem desvantagem exagerada ao consumidor.

  • Assim, com relação ao contrato, vimos que é abusiva a cláusula contratual que autorize a instituição de ensino modificar a grade curricular ou que autorize a cancelar o contrato de forma unilateral, após a assinatura. Embora a instituição de ensino superior tenha autonomia didática, administrativa e financeira, a mesma não pode alterar a grade aumentando ou diminuindo o período de conclusão do curso de forma unilateral, após o estabelecimento do contrato.

  • Outra consideração a ser feita refere-se as mensalidades. Vimos que os alunos pagam um valor total pela prestação dos serviços de ensino superior e este valor é parcelado em seis ou doze parcelas de acordo com o regime estabelecido (semestral ou anual). Os valores destas parcelas não podem ser majorados em período inferior a um ano, a contar da data da assinatura, nos termos do art.1°, §4°, da Lei 9870/99. Também, a divulgação dos valores deve ser posto a disposição dos alunos 45 dias antes do prazo para a efetivação da matricula e que qualquer aumento das mensalidades devem se dar de forma justificada, nos termos do art. 39, X, do CDC.

  • Por fim, no caso de atraso no pagamento das mensalidades, isto é no caso de inadimplência, o CDC e a Lei 9870/99, proíbe uma série de atos por parte das instituição de ensino. Estas vedações decorrem dos direitos básicos dos consumidores. Não pode a instituição cobrar de forma abusiva os alunos, colocando-os em situação de ridículo ou constrangimento (art.42, CDC). Neste diapasão, o art.6°, da Lei 9870/99, determina que não se pode suspender a aplicação provas escolares, reter documentos escolares ou a aplicar quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento.

  • Todavia, as instituições, por atraso no pagamento das mensalidades escolares, podem cobrar multa de 2%, do valor do inadimplemento, além de não ser obrigada a renovar a matricula do aluno inadimplente.


Estas foram as principais ponderações extraídas deste trabalho, e uma reflexão se pode fazer a partir destas: o respeito mútuo nos contratos de ensino superior particular, o respeito às leis, ou seja, ao próprio Estado Democrático de Direito em que o Brasil se constitui, implica no respeito ao cidadão que já enfrenta várias adversidades sociais e econômicas para alcançar uma graduação superior, e conseqüentemente no melhoramento na prestação dos serviços de ensino superior e na construção de uma sociedade mais justa e igualitária.



BIBLIOGARFIA


1 - GOMES, Orlando. Contratos, Rio de Janeiro, Ed. Forense.


2 - JUNIOR, Nelson Nery et allii, Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, p. 320, Forense Universitária, Rio de Janeiro, 1991.


3 - MIRANDA, Pontes de, Tratado de Direito Privado, Parte Geral, Tomo III, Ed. Bookseller, 2000, pág.245.


4 - ALVIM, Arruda e Thereza Alvim, ed. Revista dos Tribunais, Código de Defesa do Consumidor Comentado.


5 - MARQUES, Claudia Lima, Cf. Contratos no Código de Defesa do Consumidor, pág. 31, RT, São Paulo, 1992.


6 - BENJAMIN, Antonio Herman de Vasconcelos, Cf. Contratos no Código de Defesa do Consumidor, pág. 31, RT, São Paulo, 1992.


7 - Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Ante Projeto, Ed, Forense Universitária.


1 Dr. Newton Rubens de Oliveira, advogado, bacharelado pela Universidade Paulista – UNIP/DF, Instrutor de Direito Penal e Processual Penal da Policia Militar do Distrito Federal nos cursos de formação de Cabo e Sargento e Coordenador de Projetos da Agência Juvenil de Direitos – organização civil do terceiro setor.

2 Diagnóstico da Reforma do Ensino Superior 2003, por Paula Yone Stroh, Alfredo Pena-Veja e Elimar Pinheiro do Nascimento.

3 Nota. De acordo com o presidente da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes) e coordenador do evento, Hélgio Trindade, a expansão do ensino superior na Europa ocorreu com mais intensidade no setor público. “Exemplos clássicos estão na Alemanha e na França, que se equiparam aos casos de países como México e Argentina”, disse. Mesmo o México, que adotou as primeiras reformas neoliberais, estabeleceu em 20% o limite do setor privado na educação superior.

Já o Brasil, o Chile e a Colômbia demonstram uma forte tradição no desenvolvimento do ensino privado. Segundo relato de Hélgio Trindade, nos últimos 30 anos, o Brasil tornou-se o país da América Latina com uma proporção maior de privatização do ensino superior: apenas 30% das universidades são públicas – 70% são particulares (Fonte, site www.mec.gov.br, noticias sobre a reforma do ensino supeiror).

4 Gomes, Orlando. Contratos, Rio de Janeiro, Ed. Forense, pág. 5

5 idem.

6 Cons. Wieacker, História Del Derecho Privado de la Edad Moderna, ps. 272 e segs.

7 Gomes, Orlando. Contratos, Rio de Janeiro, Ed. Forense, pág. 22

8 CF. Nelson Nery Junior et allii, Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, p. 320, Forense Universitária, Rio de Janeiro, 1991.

9 É o que se observa, inclusive, das Decisões do Superior Tribunal de Justiça, cite-se como exemplo: RESP 476649 / SP ; RECURSO ESPECIAL, 2002/0135122-4, que teve como Relatora a Ministra Nancy Andrighi, onde ficou patente a aplicabilidade do CDC, na seguinte ementa: “Consumidor. Contrato de prestações de serviços educacionais. Mensalidades escolares. Multa moratória de 10% limitada em 2%. Art. 52, § 1º, do CDC. Aplicabilidade. Interpretação sistemática e teleológica. Eqüidade. Função social do contrato”.

10 Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, Parte Geral, Tomo III, Ed. Bookseller, 2000, 245.

11 Gomes, Orlando. Contratos, Rio de Janeiro, Ed. Forense, pág. 77

12 idem. Pág. 79

13 Código de Defesa do Consumidor Comentado, Arruda Alvim e Thereza Alvim, ed. Revista dos Tribunais.

14 Cf. Contratos no Código de Defesa do Consumidor, pág. 31, RT, São Paulo, 1992

15Código de Defesa do Consumidor Comentado, Arruda Alvim e Thereza Alvim, ed. Revista dos Tribunais.

16 Gomes, Orlando. Contratos, Rio de Janeiro, Ed. Forense, pág. 161

17 Código de Defesa do Consumidor Comentado, Arruda Alvim e Thereza Alvim, ed. Revista dos Tribunais

18 Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Das Praticas Comerciais, Ed. Forense.

19 Código de Defesa do Consumidor Comentado, Arruda Alvim e Thereza Alvim, ed. Revista dos Tribunais

20 Nelson Nery Junior, in Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Ante Projeto, Ed, Forense Universitária.

21As invalidade, modernamente, reclamam tratamento microssistemico, o que foi feito pelo CDC, a fim de poderem atender às peculiaridades existentes no microssistema. (Nelson Nery Junior, in Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Ante Projeto, Ed, Forense Universitária).

22 Vide Capitulo VI que trata da matrícula.

23 Nelson Nery Junior, in Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Ante Projeto, Ed, Forense Universitária.

24 Fonte, site do DPDC/SDE/MJ, link “perguntas mais freqüentes”.

25 Antonio Herman de Vasconcelos e Benjamin, in Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Ante Projeto, Ed, Forense Universitária.

26 Diagnóstico da Reforma do Ensino Superior 2003, por Paula Yone Stroh, Alfredo Pena-Veja e Elimar Pinheiro do Nascimento.